Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

“Confucius” de Yasushi Inoue

19 de agosto de 2010
Por: Naomi Doy | Seção: Livros e Filmes | Tags: China, dinastia Zhou, PerĂ­odos da “Primavera e Outono” e dos “Estados Guerreiros”, “idade axial”: 771-221 a.C. | 5 Comentários »

ConfĂșcio ensinando, retratado por Wu Daozi, Dinastia Tang Na China dos anos 771-221 a.C., aproximadamente 170 estados familiares nobres reinavam fora do controle central. Cada estado tinha a sua capital murada; formavam alianças e ligas entre si, e tambĂ©m travavam acirrados combates militar-diplomĂĄticos, tentando dominar um ao outro. Na era dos Estados Guerreiros, sete reinos dominavam a PlanĂ­cie Central ao Norte do paĂ­s, entre os Rios Amarelo, Huai e seus volumosos afluentes.

Paradoxalmente, essa Ă©poca de guerras tambĂ©m suscitou o aparecimento de pensadores que propunham bases teĂłricas para cultivar uma sociedade humana em harmonia com a ordem do Universo Ă  qual pertenciam. Os reinos, cansados de guerras e destruiçÔes, ansiavam por ordem e paz. Pensadores tentavam inspirar reis a procurar viver em harmonia sob o domĂ­nio de um Ășnico rei, como contava a lenda de uma Ă©poca dourada quando a China era unificada.

ConfĂșcio (551-479 a.C.) e seus discĂ­pulos faziam parte de um grupo de pensadores precursores desse tempo. Foram contemporĂąneos de grandes mestres da Índia (Buda, circa 560-480 a.C.) e da GrĂ©cia (PlatĂŁo, 420-340 a.C. e AristĂłteles 380-320 a.C.), entre outros. Época que historiadores denominam “idade axial” – quando se estabeleceram as primeiras formas bĂĄsicas do pensamento da civilização no mundo.

Em Confucius, Peter Owen Publishers, Londres-1992, tradução do japonĂȘs KĂŽshi-1989, o autor Yasushi Inoue relata que os filĂłsofos das centenas escolas de pensamento da China nĂŁo conseguiram apaziguar a desordem, e o confucionismo sĂł se tornaria uma filosofia influente sĂ©culos depois, difundido atravĂ©s de discĂ­pulos e seguidores. Os ensinamentos orais de ConfĂșcio seriam compilados em obras como o Lunyu, ou Analectos, um conjunto de conceitos do filĂłsofo. PorĂ©m, o contexto de “violĂȘncia ratificada” dos Estados Guerreiros, com seus assassinatos e rituais, mostra como nasceu o ensino confucionista e porque ele foi adotado. A base lĂłgica para organizar a sociedade começou com a ordem universal e sua hierarquia de relaçÔes entre superiores e inferiores, fundadas no princĂ­pio da virtude e do exemplo, na conduta apropriada dos que “estĂŁo acima”.

O escritor narra o caminho percorrido por ConfĂșcio atravĂ©s do olhar de um discĂ­pulo de ficção, Yen-chiang. Nascido no estado de Lu, hoje cidade de Qufu, na ProvĂ­ncia de Shandong, ConfĂșcio jamais tinha saĂ­do de sua terra quando, aos 50 anos de idade, foi “inspirado por um mandato do CĂ©u”, que o impulsionou a sair numa viagem de 14 anos pela PlanĂ­cie Central em busca de algum dignitĂĄrio que aplicasse seus pensamentos na legislação e na administração.

A recepção que ConfĂșcio e seu pequeno sĂ©quito de 3 a 4 discĂ­pulos tinham nos vilarejos e capitais mostra como o mestre e seus ensinamentos eram jĂĄ conhecidos e reconhecidos fora de Lu. Por onde passavam, eles tinham alojamento, refeiçÔes e local para pregação Ă  disposição. Muitas vezes eram convidados a passar dias nos palĂĄcios dos reis de estados. PorĂ©m, nĂŁo raro eram tambĂ©m hostilizados e correram muitos perigos por caminhos inĂłspitos, observados por guerreiros inamistosos; cruzaram e navegaram por rios turbulentos em frĂĄgeis embarcaçÔes.

Yen-chiang descreve a rara simplicidade e humanidade do mestre no convĂ­vio cotidiano, ao mesmo tempo imbuĂ­do de uma extraordinĂĄria aura de carisma e distanciamento. A narrativa se faz atravĂ©s de uma sĂ©rie de palestras para alunos e iniciados, bastante acessĂ­vel Ă  nossa compreensĂŁo. Explora a vida e os ensinamentos de ConfĂșcio por meio de perguntas feitas por estudantes, e expĂ”e a essĂȘncia da filosofia do mestre citando trechos dos Analectos. Como os Evangelhos de Cristo, os Analectos sĂŁo a fonte onde se encontra o verdadeiro ConfĂșcio.

NĂŁo alcançando a liderança polĂ­tica que desejava, ConfĂșcio empenhou-se em reformar e salvar a sociedade, e resgatar a civilização por meio do debate Ă©tico. Vinte e cinco sĂ©culos depois, a leitura de Confucius nos dĂĄ a impressĂŁo de que o mestre se dirige diretamente aos problemas de nossa Ă©poca.

Com a propagação da civilização chinesa, o confucionismo alcançou e marcou outros países da Ásia, notadamente a Coreia, o Japão e o Vietnã. Respeito à hierarquia e às tradiçÔes, amor ao trabalho bem feito, e moral severa são os traços que ainda permanecem de seus ensinamentos.


5 Comentários para ““Confucius” de Yasushi Inoue”

  1. Alvaro
    1  escreveu às 00:04 em 21 de agosto de 2010:

    Paulo
    Excelente matéria sobre Confucio, a abordaem Confuciana é usada na teoria do pensamento paralelo (autor Dr.Edward de Bono), que aprendi com o coach Jose Adilson Valerio em cursos de team coaching.

    Realmente a leitura de ConfĂșcio vale a pena e traz de volta muito conhecimento Ăștil que podemos “voltar” a aplicar nos dias de hoje.
    Abs
    Alvaro

  2. Paulo Yokota
    2  escreveu às 21:14 em 21 de agosto de 2010:

    Caro Alvaro,

    Obrigado pelo comentĂĄrio, e credito Ă  Naomi Doy pelo excelente trabalho. O que Ă© possĂ­vel observar no Extremo Oriente (principalmente China, Coreia e JapĂŁo) Ă© a forte influencia dos ensinamentos de ConfĂșcio atĂ© os dias de hoje, como o respeito aos idosos, os mais veteranos, aos professores que sĂŁo Ășteis em qualquer sociedade.

    Paulo Yokota

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    3  escreveu às 03:45 em 17 de outubro de 2010:

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    Keep up the great work!

  4. alfredo martins
    4  escreveu às 13:46 em 27 de dezembro de 2010:

    Apesar de muitas fantasias chinesas, a realidade de Confucius superou o tempo

    e imortalizou as suas palavras.

  5. Paulo Yokota
    5  escreveu às 14:20 em 27 de dezembro de 2010:

    Caro Alfredo Martins,

    Obrigado por acessar o site. Confucius não só influenciou a China como todo o Extremo Oriente. Parte dos seus ensinamentos são utilizados no Japão e na Coreia, fazendo com que a educação seja uma prioridade, bem como o respeito aos mais experientes e professores. Isto tem resultado numa elevada eficiência do sistema educacional da Ásia.

    Paulo Yokota