Resiliência, Tenacidade e Perseverança dos Japoneses
14 de março de 2011
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos | Tags: Japan Times, New York Times, NHK World, TV5 Monde; terremoto e tsunami no Nordeste do Japão
Terremoto de magnitude sem precedentes no Japão (sismografia mais detalhada indica que foi de 9.0 Richter), seguido de destruidor tsunami que varreu o nordeste do Japão, ao longo do litoral. Mesmo nas cidades mais distantes do epicentro – como em Tóquio –, as pessoas tiveram dificuldade até de se manter em pé nas ruas, nos infinitos segundos em que a terra tremia no primeiro forte sismo; está seguido de vários outros tremores de mais de 6.0, nas horas seguintes. Centenas de mortos, milhares de desaparecidos. Com os impactos, acidentes em usinas nucleares da área causam preocupação global; centenas de milhares de pessoas, algumas já desabrigadas pelo tsunami, foram evacuadas. Pela primeira vez, desde que foi estabelecida em 1951, a Tokyo Electric Power está racionando o fornecimento de energia elétrica a partir da segunda feira.
Águas que invadiram cidades litorâneas por vários quilômetros, adentrando arrozais e plantações, lá permanecem ainda, mais de três dias após o tsunami, sem recuarem para o mar – como seria o normal em maré alta. Especialistas dizem que, no momento do sismo maior, as terras ao longo do litoral podem ter afundado de 0,60 a 0,70 m em alguns locais. Onde era praia e terra firme virou mar, como aconteceu com ilhas da Sumatra quando do grande tsunami de 2004. Dentro de meses o nível da terra talvez volte a subir uns 0,30 m, e a água recuar. Talvez não.
Bambus, exemplos de resistência e tenacidade seguidos pelos japoneses
O mundo acompanha a provação e o pesadelo do povo japonês, sentindo, como eles, impotência diante do poder devastador da natureza, e compartilhando o sentimento de desolação e incerteza. Mas apesar da dor e desespero, eles não protestam, nem se revoltam; aceitam resignados os desígnios do destino, o mandato dos céus e dos deuses da natureza da qual os japoneses sempre se sentiram fazendo parte: mar, rios, campos, florestas e montanhas sempre foram sagrados e respeitados pelos japoneses, é de onde vem a vida. Quanto mais se venera a natureza, tanto mais dolorosa é a fúria impiedosa com que ela devasta e castiga. Foi sempre assim através dos séculos, e foi o que fez do Japão uma das nações que mais pesquisam e investem em prevenção de desastres naturais e sismos.
Imbuída desta natureza e das quatro estações distintas, a cultura japonesa está repleta de símbolos intimamente ligados a animais, montanhas, árvores, águas, flores: tanto para representar força e energia, como também fragilidade e doçura. No Ano Novo, por exemplo, é tradição enfeitar soleiras e halls com arranjos da trilogia shochikubai, de auspicioso significado: sho = matsu, pinheiro; chiku = takê, bambu; e bai = ume, ameixeira. Cada um com seu simbolismo para fortaleza, resiliência e tenacidade e estoicismo. O bambu, mesmo vergado até o solo quando açoitado por poderosos ventos, volta à forma ereta assim que passa a adversidade; permanece verde o ano inteiro, ao sol e à neve; suas raízes, embora não muito profundas, se fixam tão firmemente na terra que é quase impossível arrancá-las. O bambu não se deixa quebrar. É tema em versos, canções e pinturas de tempos remotos, como evocação da tenacidade.
Resiliência é a capacidade de se recuperar e restabelecer sua forma original após ser castigada inclementemente. Ultimamente psicólogos incorporaram essa noção ao ser humano, como apoio para fortalecer o espírito – para afugentar depressões e fragilidades da alma e da mente.
Emissoras, como a estatal NHK, orientam a população com notícias e informações ininterruptas 24 horas por dia. O primeiro-ministro Naoto Kan sobrevoou áreas devastadas e tem falado através de rede televisiva. Pediu a união de todos para que o povo japonês, passado este momento de provação, possa dizer com orgulho que, com o congraçamento de todos, conseguiu reconstruir colaborando no renascimento do país. Assegurou que ele, ministro, está empenhando sua vida nesse empreendimento. Os partidos da oposição decidiram estabelecer uma trégua, interromper os infindáveis e vazios ataques e blábláblás políticos, para apoiar o governo quando o país enfrenta a pior crise desde a Segunda Guerra. Uma atitude, aliás, mais do que óbvia, demorou.
Setenta países estão oferecendo ajuda humanitária e concreta ao Japão. Em belo artigo, Nicholas D. Kristof, do The New York Times (Sympathy for Japan, and Admiration – 11/03/2011), demonstrando sua profunda vivência com a cultura e a alma japonesas, afirma que “iremos ver a nobre e corajosa resiliência e perseverança dos japoneses brilharem nos dias que virão, quando eles trabalharão unidos por um objetivo único, coletivo e comum, e o mundo tirará da sua recuperação, um grande exemplo”. Assim seja. Vamos torcer.