Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

Resenha Literária Sobre a Obra de Ezra Vogel

23 de outubro de 2011
Por: Paulo Yokota | Seção: Cultura, Editoriais, Notícias, webtown | Tags: a obra de Ezra F. Vogel, resenha publicada por Jonathan Mirsky no International Herald Tribune

Tudo que se publica sobre a China parece carregar a posição ideológica do autor, sempre sendo a favor ou contra. O trabalho monumental de Ezra F. Vogel, professor emérito de Ciências Sociais da Universidade de Harvard, “Deng Xiaoping and the Transformation of China”, da Harvard University Press, 876 páginas, sofreu uma crítica feroz de Jonathan Mirsky neste fim de semana no International Herald Tribune.

Ezra Vogel escreveu este monumental livro mostrando que Deng Xiaoping é o principal responsável que inspirou as reformas que levaram a China para as formidáveis transformações observadas naquele país e no mundo, depois do desaparecimento de Mao Tsetsung, mas admite que elas foram executadas pelo Hua Guofeng que sucedeu a Deng Xiaping. Jonathan Mirsky coloca que Deng Xiaoping não se opôs ao Mao na massiva morte de milhões de chineses pela fome, foi o responsável pela tragédia de Tiannanmen, acabou permitindo o aumento da corrupção e só pensou em sua carreira.

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Deng Xiaoping, Ezra F. Vogel e Jonathan Mirsky

Tudo indica que estas posições estão influenciadas pelas ideologias abraçadas pelos seus autores, para refletirem considerações tão contrárias. Pelo muito que se escreveu sobre estes assuntos, parece que na China neste período conturbado que vem desde a época da Longa Marcha até os dias de hoje permitiu a sobrevivência de alguns líderes que tinham convicções divergentes das dominantes. Zhou Enlai, tudo indica, protegeu Deng Xiaoping que, nascido em criado em Sichuan, teve um pequeno período de estudos em Moscou e em Paris, como muitos líderes que se encolheram no ostracismo durante alguns períodos como os da Revolução Cultural. Parece legítimo que a sobrevivência era indispensável, para que suas ideias, que foram se transformando e consolidando ao longo do tempo, tivessem a possibilidade de aflorar, nas oportunidades que se apresentavam.

Muitos que imaginam que só existia a hegemonia de um pensamento podem estar enganados. Sempre houve uma disputa surda de orientações diversas, mas seria um suicídio opor-se abertamente as fúrias como a da Revolução Cultural. Também as questões de segurança interna, ainda que tenham gerado episódios lamentáveis como a da praça de Tiannanmen que foram transmitidas ao vivo para todo o mundo, mostram disputas que ocorriam inclusive na área militar.

Que existem manchas decorrentes de omissões durante as fúrias das tendências em choque não parece contestável. Os movimentos como o da Revolução Cultural não podem ser atribuídos somente a Gangue dos Quatro, na decadência de Mao. Massas de jovens foram envolvidas nas suas empolgações para posterior arrependimento de muitos.

Parece que o pragmatismo foi praticado por muitos, e os chineses tiveram a capacidade de absorver variados períodos em que predominaram algumas tendências. Fui testemunha de muitas críticas que foram formuladas pessoalmente sobre muitos excessos cometidos em várias fases. Se a China voltou a ser o que é hoje, parece que isto se deve a sua longa história, dimensão, cultura, que com desvios vários, foi se consolidando ao longo do tempo. Mas tudo indica que existe a convivência cada vez maior de muitas tendências, que são indícios de uma ampla diversidade política.