Tentando aproximar a Ásia da América do Sul e vice-versa

Por Uma Coexistência Segura de Pedestres, Ciclistas e Motoristas

8 de março de 2012
Por: Naomi Doy | Seção: Depoimentos, webtown | Tags: educação e leis para ciclistas folgados no Japão, motoristas hostis e machistas em São Paulo, pedestres incautos lá e cá

Acidentes envolvendo bicicletas e ciclistas preocupam muito no Japão também. Terceiro país do mundo em número de ciclistas, a bicicleta ganha cada vez mais adeptos no Japão pela sua mobilidade, energia limpa, facilidade de estacionamento e salubridade. É meio de transporte conveniente para fazer pequenas entregas, mães levarem e buscarem crianças na escola, donas de casa irem a compras, idosos ativos circularem. Muito mais gente tem aderido ao uso de bicicletas desde o terremoto de 11 de março há um ano, quando o transporte público bloqueado dificultou milhares de pessoas voltarem para casa.

Em países como Holanda, Alemanha ou Suécia há uma cultura bastante rígida no acatamento das leis que regem o uso da bicicleta como meio de transporte – enquanto no Japão o ciclismo foi sempre encarado mais como opção casual e de lazer, já que transporte público prima pela eficiência. Ciclistas ignoram regras mais básicas de circulação. É comum bicicletas transitarem nas calçadas ou no contrafluxo, ciclistas falando ao celular, curtindo músicas com fones de ouvido; mães estacionam suas bikes no meio fio deixando filhos na garupa enquanto entram para uma comprinha em lojas; embora obrigatório jovens abrem mão de itens de segurança como capacetes, e usam bicicletas de corrida nas ruas: piste bikes, leves e visual legal, mas perigosas para manobras emergenciais, pois contam somente com breque de pedal. O assunto agita mídia e público, abundam acidentes com vítimas envolvendo ciclistas folgados e pedestres desavisados (entre outros: Securing safe cycling for the benefit of all – Daily Yomiuri, 30/nov/2011; Schooling for cyclists, 03/nov/2011 e National bicycle policy needed, 26/fev/2012, Editoriais, The Japan Times).

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Ciclista na Avenida Paulista, ciclovia na Marginal Pinheiros e ciclorrotas na cidade de São Paulo

Mais ciclovias e faixas para bicicletas deveriam ser criadas – embora encontrar espaço de qualquer espécie não seja fácil nas áreas urbanas ultracongestionadas do Japão. Exigem-se leis mais rígidas, educação para ciclistas, e amplas campanhas de divulgação das normas de trânsito para ciclistas, pedestres e motoristas em geral. Cidades tomam iniciativas por conta própria: Nagoya criou incentivos para funcionários municipais utilizarem corretamente suas bicicletas para ir aos locais de trabalho; Shizuoka decretou regulamentos de trânsito próprios, e abriu novas ciclovias de mão-única no município. Enquanto isso, Tóquio tem somente 40 km de pistas estabelecidas para ciclistas, algumas delas ainda incorporadas às calçadas!

A cidade de São Paulo tem hoje 50,5 km de vias exclusivas para bicicletas, abertas todos os dias da semana, o que significa nada, se a ideia é dar segurança para quem quiser se locomover de bicicleta. Nos fins de semana, ciclofaixas de lazer vêm sendo implantadas pela Prefeitura em algumas avenidas amplas – excelente iniciativa para conscientizar e acostumar pessoas à circulação das magrelas. Mas no elegante bairro de Moema, muita gente protestou, pois… restringem suas conveniências. O Rio de Janeiro conta com cerca de 250 km de pistas para bikes, ligando distâncias como o Recreio ao Aeroporto Santos Dumont. Porém, nos anos 90, quando a cidade sacrificou quilômetros de estacionamentos para carros na orla para construir suas primeiras ciclovias, a grita foi geral – “o Rio não tem ciclistas!”, berraram. Hoje, a população se tornou adepta das bicicletas, e mais pistas e bicicletários estão prometidos pelo projeto Bike Rio.

Além de não ter um sistema interligado de ciclovias que permitam deslocar com segurança pela cidade, ciclistas paulistanos sofrem com a ignorância de motoristas quanto às leis de trânsito brasileiras: a bicicleta é meio de transporte alternativo que deve circular na rua entre a faixa preferencial de ônibus e a de carros, no mesmo sentido dos veículos. Estes devem manter distância mínima lateral de l.5 metro das bicicletas nas ultrapassagens, sob pena de multa. Devido à falta de conhecimento, porém, ciclistas são alvos frequentes de agressivos gritos, “vai pra calçada, anta!” – exatamente como há uns 40 anos, quando mulheres paulistanas ao volante, por mais exímias e gabaritadas que fossem, levavam desaforos neandertais de motoristas homens, tipo “vá pilotar fogão, dona Maria!”.

A cidade de Paris conta hoje com 440 km de ciclovias e ciclofaixas, com projetos para aumentar para 700 km até 2014, dentro dos limites urbanos. Paris pode se dar a esse luxo porque lá urbanistas não dão a mínima para o que motoristas ou elite pensem ou gritem: em muitas grandes avenidas parisienses, a pista junto ao meio fio é reservada exclusivamente para ônibus e bicicletas. Se as outras pistas ficarem congestionadas e paradas, os que estão ao volante de carros têm apenas que se conformar com isso, e nem ousar pensar em bandear para a pista que não lhes é de direito. A ideia é que eles possam ficar frustrados, desistam, larguem seus carros em casa, e migrem para transporte coletivo (afinal o metrô deles é tão eficiente!), ou para… bicicletas. Simples assim.