Reportagem de Envergadura Sobre a China
18 de junho de 2012
Por: Paulo Yokota | Seção: Cultura, Economia, Editoriais, Notícias, Política, webtown | Tags: reportagem especial do The Economist, republicado em português na CartaCapital
The Economist costuma ser crítica sobre a China, pela sua posição ideológica mais liberal, o que ressalta a importância desta reportagem especial que tem o título em inglês de “Pedalling prosperity”. Ela foi republicada em português pela revista CartaCapital na sua íntegra, com exclusividade, apesar de ocupar mais de 10 páginas. Traz informações que esclarecem aspectos que são erroneamente considerados até pelos que acompanham a evolução daquele país asiático nas últimas décadas, e que exige aperfeiçoamentos para continuar no seu caminho de desenvolvimento, vital para o resto do mundo.
Num gráfico expressivo que compreende informações desde 1980 até hoje, com dados compilados pela CEIC Data, especializada em estatísticas sobre os países emergentes, a reportagem mostra que o crescimento do PIB chinês veio dependendo fortemente dos seus investimentos e consumos internos, e marginalmente de suas exportações líquidas, ou seja, deduzidas as importações. O seu consumo privado veio declinando desde o início de sua decolagem, menos que ocorreu no Japão e na Coreia, sendo que seus investimentos superaram o que ocorreu neste outros dois países do extremo leste da Ásia. A reportagem informa que cerca de metade do PIB daquele país é poupada, não dependendo do exterior para financiamentos e investimentos.
Os investimentos chineses vieram sendo feitos na construção civil, tanto em edificações comerciais ou habitações de famílias como na infraestrutura, além do seu parque produtivo. Continuam insuficientes, ainda que haja alguns que não contam com condições de honrar seus financiamentos com a redução do crescimento da economia da China. Chegaram a ter a metade da indústria de construção civil do mundo, melhorando seus produtos como equipamentos que hoje são competitivos em preços e tecnologias com o exterior.
Ainda que não tenham toda a eficiência de muitas empresas do exterior, copiaram muitos produtos que começaram a produzir como terceirizados, utilizando inicialmente a sua vasta disponibilidade de mão-de-obra. Hoje, além das empresas provenientes do exterior, suas próprias empresas abastecem o mercado interno que continua crescendo com a interiorização do desenvolvimento. É preciso notar que a melhoria na infraestrutura de transportes e comunicações eleva a produtividade das regiões interioranas.
Em que pese o conceito no exterior que toda a administração pública chinesa é controlada pelo seu partido único, existe uma descentralização do comando que é eleito localmente. Estes administradores disputam a sua ascensão política com o desenvolvimento de suas regiões, que teoricamente deve-se à meritocracia. Mas deve-se reconhecer que existem desperdícios com obras faraônicas, algumas que estão subutilizadas além de estatísticas de validade duvidosa.
Existem dúvidas sobre o sistema bancário chinês, pois muitos dos seus financiamentos para autoridades locais ou estatais, ou mesmo para as empresas privadas são de retornos duvidosos, incluindo subsídios. Além disso, existem muitas operações financeiras que não são efetuadas pelo sistema bancário. O fato concreto é que mesmo no Ocidente o sistema bancário acaba sendo suportado pelo governo, quanto mais na China em que alguns investimentos e financiamentos são feitos para manter a competitividade chinesa.
Todos reconhecem que num país gigantesco como a China é muito difícil às autoridades conseguir controlar tudo. Os chineses possuem uma cultura milenar de guerras e opressões das autoridades, tendo a capacidade de contornarem as orientações oficiais. Uma parte da demanda de luxo, tudo indica, decorre de patrimônios que não eram de conhecimento das autoridades. Quando a China abriu-se para o exterior, intensificando-se o uso dos mecanismos de mercado, constatou-se esta realidade, principalmente no meio rural.
O setor público da China é considerado como uma colcha de retalhos, inclusive nas estatais que são dominadas por grupos. Os serviços sociais são diferenciados, não havendo a condição para atendimento de todos, principalmente na saúde. Mas não se pode julgar aquele país pelos padrões ocidentais, pois o povo chinês aprendeu a viver dentro de limitações que sempre existiram. O que parece que se torna mais dramático é com o elevado nível de imigração para as grandes cidades, onde não se conta com o tradicional amparo das famílias e dos clãs.
Parece que existem estudos que estão sendo efetuados em diversos centros, e os chineses estão conscientes das reformas que necessitam ser efetuadas, até pelas autoridades máximas. O artigo aponta que parecem existir três escolas de pensamento: a primeira admite que a China ainda tenha muito espaço para crescer, e que precisa disto para retirar ainda os que estão em níveis de pobreza absoluta.
Outros entendem que a sobrecarga dos desequilíbrios sobre a China vai se acumulando a ponto de comprometer a sua possibilidade de crescimento, que deverá ser reduzida. E o governo que veio retirando a sua legitimidade com o crescimento enfrentará dificuldades.
The Economist, depois destes estudos e artigos, chega à conclusão que existe uma terceira forma de pensar. Existem problemas significativos, mas nada que não se possa enfrentar. O seu sistema financeiro continua melhor que muitos de outros países, havendo investimentos que devam ser corrigidos, mas existem patrimônios suficientes para os serem.
O problema é que sua população envelhece, a poupança tende a reduzir-se, exigindo que a China seja mais prudente no futuro. Mas, comparando com o que ocorria há vinte anos, ela hoje tem horizontes mais amplos, havendo outros problemas a serem observados. O desenvolvimento não é a única coisa que conta, mas ela é fundamental, segundo a revista.
Considerando a longa história chinesa, verifica-se que como bons comerciantes que são, os chineses são pragmáticos e ainda que aspirem naturalmente maiores liberdades, sempre viveram sob algum tipo de autoritarismo. Estão melhorando suas pesquisas, contam com uma capacidade de atingir um razoável consenso, e a sua atual dimensão não permite mais aventuras, necessitando conviver também com o resto do mundo, mesmo com suas diferenças.