Qualidade de Vida dos Idosos Terminais
24 de julho de 2013
Por: Paulo Yokota | Seção: Editoriais, Notícias, Saúde, webtown | Tags: artigo de Kanoko Matsuyama no Bloomberg, discussão dura e inevitável das famílias, problema universal dos cuidados paliativos
Muitos evitam as discussões de assuntos difíceis relacionados com os idosos, que estão aumentando em todo o mundo, como se isto ajudasse a atenuar estes duros problemas que estão crescendo e são inevitáveis. Muitos idosos não podem opinar sobre o que os mais afetam no final de suas vidas. Um artigo longo e detalhado da jornalista Kanoko Matsuyama discute no site da Bloomberg sua experiência pessoal, colocando o delicado problema dos cuidados paliativos que preocupam tantos os geriatras, sem que os familiares antecipem pontos relevantes das discussões necessárias para atingir as soluções adequadas para cada caso, com a maior objetividade possível.
É evidente que o assunto envolve muitos aspectos emocionais e afetivos, bem como algumas convicções religiosas. Mas, parece que os próprios idosos devem contar com opções e participar dos debates enquanto têm condições para tanto, mesmo que não se envolva discussão como da eutanásia. Trataria do assunto como da mera preservação somente física da vida, com medidas consideradas heroicas, quando não existe mais nenhuma possibilidade de recuperação e os pacientes idosos não teriam mais condições mentais para optar sobre a qualidade de suas vidas.
Só no Japão, cerca de 250 mil idosos são mantidos vivos, muitas vezes por anos, com um tubo de alimentação inserido nos seus estômagos, que são irreversíveis. A avó da autora do artigo, com 96 anos, e as condições precárias de saúde devido a idade, passou também a contar com este dispositivo, sem que a família tivesse participado desta decisão que foi tomada por uma enfermeira.
Mesmo no Japão, onde a morte dos idosos é encarada com maior naturalidade culturalmente por influência religiosa, o artigo informa que o Economist Intelligence Unit efetuou uma pesquisa em 2010 em 40 países desenvolvidos, classificou o país em 23º lugar na “qualidade de morte”. Consideraram-se os critérios como o custo do fim da vida e seus cuidados, e da forma como as sociedades cuidam os assuntos relacionados com a morte de forma ampla.
Segundo Tetsuo Kashiwagi, presidente do Japan’s Hospice Palliative Care Foundation, não se discute muito naquele país sobre a morte, sendo raros os debates sobre os desejos de continuar vivendo e as decisões sobre o fim da vida. Os hospitais estão focados na extensão da vida dos pacientes com pequenas chances de recuperação a qualquer custo, que não preservam a qualidade de vida. Os usos de tubos de alimentação, que não são convencionais no Ocidente, são usuais no Japão, sendo que 12% dos pacientes são alimentados desta forma por cinco ou mais anos, segundo as pesquisas efetuadas pela associação dos hospitais.
Segundo Kanoko Matsuyama, sua avó foi privilegiada durante a sua vida, ainda que sua família tenha perdido tudo durante a Segunda Guerra Mundial. Era a matriarca de sua família e procurava cuidar de todos, inclusive seus amigos, da melhor forma possível. Seus familiares desejavam que ela tivesse as melhores condições para o período terminal sua vida, ainda que notassem o declínio natural que estava ocorrendo na sua mente. Era alimentada com colheres com alimentos pastosos, mas ninguém lhe perguntava quais eram seus desejos para o fim da vida. Não imaginavam que teriam que usar um tubo para a sua alimentação, que inicialmente era feito pela narina e depois com um procedimento direto para o estômago.
Na cultura japonesa, segundo a autora, existe a atitude conhecida como “honne e tatemae”, ou seja, a diferença do que é sentido pessoalmente e o que é expresso publicamente, que dificulta a discussão sobre a morte mesmo dentro da família. Existem muitas coisas que são expressas de forma ambígua e não são colocadas explicitamente em discussão.
Também vieram ocorrendo mudanças no Japão nas visões sobre a vida e a morte, que eram encaradas sobre os pontos de vista do xintoísmo e do budismo, mas que se tornaram mais materialistas com o desenvolvimento econômico recente. A alimentação com o uso do tubo certamente melhorou a situação de sua avó do ponto de vista físico, mas as pesquisas existentes no Japão mostraram que mais de 70% dos idosos não desejavam o seu uso, mas somente 3,2% deixaram expressos os seus desejos para seus próximos.
Ela relata no artigo diversas fases da vida no Japão, ao longo do período da vida de sua avó, para permitir uma melhor avaliação do que pretendiam os seus familiares. Mostra que não se tratava de um caso de desconsideração com uma idosa, mas as circunstâncias levaram para uma situação irreversível.
O artigo faz diversas comparações com o que acontece no Japão e nos Estados Unidos nos assuntos relacionados com os tratamentos paliativos, inclusive nos sistemas de financiamento destes custos, bem como considerações sobre as diferenças culturais com o Ocidente. Algumas diferenças são substanciais, mostrando que o que vem sendo adotado com relação aos idosos terminais não é uniforme.
Agora a autora procura discutir estes assuntos com sua mãe, diante do que ocorreu com a sua avó. Ela informa sobre as formas de tratamento dos idosos nos hospitais japoneses que diferem dos ocidentais, e no Brasil pode-se notar que há um exagero que não é compatível com as condições econômicas do país, o que acaba determinando a insuficiência de atendimento dos menos privilegiados.
Na realidade, existem conflitos que são sugeridos sobre o que se desejaria para os idosos terminais, e o pragmatismo que se torna necessário discutir, para que todos se sintam mais confortáveis no enfrentamento destas situações difíceis.