Ensaio do The Economist Sobre a Democracia no Mundo
28 de fevereiro de 2014
Por: Paulo Yokota | Seção: Editoriais, Notícias, Política | Tags: avanços no século XX, danos provocados pela crise de 2008, efeito da China, longo ensaio do The Economist sobre a democracia, retrocessos recentes
A revista inglesa de prestígio internacional The Economist publica na sua edição eletrônica um monumental ensaio sobre a evolução da democracia, informando que houve avanços no século XX, mas nos últimos anos acusam-se retrocessos. Muitos países contam com eleições que estão permitindo a longa permanência no poder de grupos que tendem ao aumento da corrupção. Muitos movimentos de rua que estão se multiplicando acabam desiludidos com as dificuldades de administração dos anseios populares que tendem a elevar seus endividamentos públicos. A crise de 2008 com o apoio ao sistema bancário com recursos públicos aumenta as desilusões. A falta de descentralização do poder em escala internacional resulta em descrédito. Os chineses alegam que estão conseguindo melhores resultados econômicos com grupos que ficam no topo do poder por uma década.
Ainda que a democracia seja entendida como o regime que permite a obtenção do progresso material com a liberdade política, a desilusão é captada por pesquisas de opinião como a redução do número de militantes dos partidos políticos. Algumas tentativas e experiências efetuadas em diversos países, em variadas partes do mundo, resultaram em situações calamitosas que não proporcionaram resultados políticos e econômicos. Muitos povos tentam regimes autocráticos na esperança de resultados.
Como o ensaio é longo, envolvendo cerca de 16 páginas nesta versão eletrônica, ele foi dividido em partes. Começa por tratar dos dramáticos acontecimentos em Kiev, relatando a aspiração popular da Ucrânia em estreitar as relações com a Comunidade Europeia, onde houve uma forte resistência da cleptocracia de Viktor Yanukovich. O movimento é contra governos corruptos, abusivos e autocráticos, mesmo depois da Revolução Laranja daquele país em 2004, com líderes mantidos por volumosas assistências dos russos.
Procura-se demonstrar que de 1980 a 2000 houve alguns retrocessos, mas depois de 2000 tem havido muitos, indicando que a democracia passa por um momento difícil. Mesmo regimes considerados democráticos e estabelecidos enfrentam suas dificuldades com seus problemas. Citam os exemplos da Grécia (1974), Espanha (1975), Argentina (1983), Brasil (1985) e Chile (1989). A think-tank norte americana, a Freedom House, classifica como democracias 120 países, 63% do mundial, tendo atingido o pico em 2000, sendo 2013 o oitavo ano consecutivo que ela diminui.
Dois motivos principais são apontados como causas destes retrocessos. A crise financeira de 2007-2008 e a ascensão da China. Muitos políticos pensavam que os ciclos econômicos e os riscos tinham sido domesticados, mas muitos ficaram desiludidos quando os governos salvaram os banqueiros com dinheiro dos contribuintes, acabando por enterrar o Consenso de Washington.
Quando os Estados Unidos dobravam o padrão de vida a cada 30 anos, a China dobrou a cada década, nas últimas três, procurando mostrar que o seu modelo funcionava melhor, escolhendo pessoas talentosas na sua elite. A opinião pública estava sendo controlada. Uma pesquisa efetuada pela Pew Global Attitudes Survey mostrou que 85% dos chineses estavam muito satisfeitos, enquanto os norte-americanos estavam com 31%. Alguns países como a Ruanda, Dubai e Vietnã estão levando a sério o exemplo chinês.
Um grande revés ocorreu no Iraque, onde os norte-americanos fracassaram na sua assistência. No Egito, também os problemas se repetem. Tudo demonstrou que a construção de instituições necessárias para sustentar a democracia é um trabalho muito lento.
O ensaio reconhece que os modelos para as novas democracias tendem a parecer disfuncionais e ultrapassados. Os Estados Unidos enfrentam suas dificuldades, com a multiplicação dos seus lobbies, e os europeus enfrentam variados problemas diferenciados por países.
A globalização mudou as políticas nacionais profundamente e os organismos internacionais procuram ajudar no processo, mas deve-se reconhecer que a democracia mundial não tem sido o ponto alto de suas atuações.
No pós-crise houve um crescimento momentâneo alimentado pelo crédito fácil, que na sua reversão criam problemas, e as insatisfações acabam sendo manifestas pelos mais jovens. O número de membros dos partidos acusam decréscimos, e a credibilidade dos políticos está baixa, e até os países líderes apresentam seus problemas internos. Revelou-se a insustentabilidade da democracia financiados pelas dívidas.
Muitos países emergentes estão repetindo os problemas dos já desenvolvidos, como no Brasil, tendendo a se repetir na Índia e até na China, que esconde problemas mais profundos mesmo com um crescimento acentuado.
A democracia tende a apresentar alternativas políticas, acabando por ser mais criativa para os problemas que surgem como os desafios que se apresentam, mas resultam em flutuações e movimentos de avanços e retrocessos. James Madison e John Stuart Mill consideravam que eram instrumentos poderosos mas imperfeitos, exigindo constantes aperfeiçoamentos, para aproveitar a criatividade humana, como a sua perversidade.
Tudo indica que existe uma ênfase exagerada na eleição, mas com pouca sobre as demais característica da democracia como os direitos individuais, liberdade de expressão e liberdade de organização. Vencer as eleições não permite fazer o que agrada, com a necessidade de convivência com as minorias.
O que parece possível de se acrescentar é que os frutos do desenvolvimento material necessitam também contar com uma distribuição adequada, pois agravando as desigualdades sempre haverá uma disseminação das insatisfações, principalmente se decorrentes de corrupções ou privilégios.
O ensaio merece uma atenção profunda e meditação sobre os aspectos que estão sendo destacados e outros que possam ser acrescentados.