Questões Sobre o Predomínio do Setor Financeiro
25 de fevereiro de 2014
Por: Paulo Yokota | Seção: Economia, Editoriais, Notícias | Tags: discussões relevantes de Howard Davis, qualificação acadêmica e experiências de responsabilidade, razões adicionais que podem ser apresentadas
O professor Howard Davies, atualmente da Sciences Po em Paris, conta com um currículo invejável para discutir este assunto que apresentou num artigo publicado pelo Project Syndicate, pois ele foi o primeiro chairman da United Kingdom’s Financial Services Authority (1997-2003), diretor e professor da London School of Economics (2003-2011), Deputy Governor do Bank of England, e Diretor Geral da Confederation of British Industry. Portanto, além de uma formação acadêmica, atuou em ambos os setores envolvidos no debate. Ele toma como base para sua discussão uma conferência feita no final do ano passado por Mark Carney, governador do Bank of England, que especula que os ativos dos bancos sediados em Londres chegariam a nove vezes o PIB dos britânicos em 2050.
Muitos discutem sobre a atual predominância do setor financeiro sobre as demais atividades econômicas, fazendo com que até cientistas e profissionais ligados à produção física sejam contratados pelos elevados salários oferecidos pelos bancos. Na realidade, a atividade financeira poderia ter a relevante função de providenciar recursos para os investimentos e demais atividades que viabilizam a produção física que vai atender as necessidades dos seres humanos, tanto de alimentação, habitação, locomoção e todas as demais atividades de atendimentos das necessidades humanas. Mas tudo indica que acreditava-se que uma certa divisão de trabalho permitiria uma eficiência maior, na medida em que os profissionais se aprofundariam no que podem exercer com maior habilidade. A exagerada concentração de todas as decisões, não reconheceriam estas habilidades diferenciadas.
Professor Howard Davies
O autor cita alguns trabalhos relevantes que tratam do assunto. Andy Haldine, do próprio Bank of England, teria feito um discurso revelador intitulado “A Contribuição do Setor Financeiro: Milagre ou Miragem”, afirmando que há uma superestimação da importância do setor financeiro.
Também cita dois artigos recentes, de Robin Greenwood e David Scharfestein, da Harvard Business School, intitulado “O Crescimento das finanças modernas”, mostrando que a parcela dos financiamentos no PIB dos Estados Unidos quase duplicaram entre 1980 a 2006, de 4,9% para 8,3%, sugerindo que as suas remunerações estariam relacionadas com as dificuldades posteriores. Poderiam ter proporcionado mais oportunidades para as aplicações das famílias, mas teriam impostos elevados custos sociais às famílias que posteriormente faliram.
Noutro artigo, Stephen G.Cecchetti e Enisse Kharroubi, do Banco Internacional de Compensações – BIS, utilizando amostras de 20 países desenvolvidos, encontram uma correlação negativa entre a participação do setor financeiro no PIB e a saúde da economia real. Teriam concorrido no emprego de físicos e engenheiros com doutoramento, para desenvolverem complexos e sofisticados modelos de hedge para os riscos. Nos anos anteriores à crise de 2008, foram contratados muitos diplomados da London School of Economics, ou como os com MBAs de Harvard.
Também se constatou algo intrigante, que as expansões de crédito estão associadas com booms na construção civil, dada à facilidade de garantias de ativos imobiliários, onde a melhoria da produtividade é lenta, podendo se transformar em negativo em muitos projetos.
A estas considerações judiciosas poderiam ser acrescentadas outras. Os profissionais do setor financeiro estão treinados para obter resultados mais rápidos, com os cálculos das taxas de retorno de um fluxo ao longo do tempo. Mas as atividades reais demandam tempos físicos maiores, estando sujeitos a riscos que nem sempre foram previstos que podem ocorrer ao longo do tempo. As mudanças tecnológicas como políticas, por mais que sejam estudadas, podem ocorrer por motivos mais variados, afetando as avaliações dos projetos.
Na medida em que houve um agigantamento do setor financeiro, aumentou sua capacidade de convencer as autoridades de que são demasiadamente grandes e podem provocar riscos sistêmicos, exigindo que as autoridades venham ao seu socorro quando ocorrem crises financeiras, como as que ameaçavam ocorrer depois de 2008. Conseguiram cobrir suas gestões ineficientes, com aportes de volumosos recursos de origem oficial, que foram arcados por toda a sociedade.
Hoje, as entidades financeiras resistem às regulações que poderiam inibir suas atividades, até criminosas, como as manipulações das taxas de juros como a LIBOR ou câmbios estabelecidos em gigantescos mercados como o de Londres. As atividades financeiras que nasceram para dar suporte às atividades de produção e de comercialização, acabaram virando elas próprias a finalidade em si, com movimentos que superam em muitas vezes as que são realizadas com bens reais, realizando-se no campo imaginário virtual.