Mudanças no Carnaval Brasileiro
4 de março de 2014
Por: Paulo Yokota | Seção: Cultura, Editoriais, Notícias | Tags: além dos grandes desfiles que se tornaram caçadores de recursos, mudanças que são uma evolução no Carnaval, multiplicação dos blocos, valorização das influências musicais fundamentais
As crises econômicas que atingem a todos acabam provocando adaptações importantes e criativas no carnaval brasileiro. Como as alegrias incontidas dos brasileiros necessitam se expressar, os grandes desfiles tendem a escolher homenagens às personalidades que podem patrocinar seus desfiles, ou localidades que dispõem de orçamentos para divulgar suas imagens, acabando por desvirtuar ainda mais estes grandiosos espetáculos explorados pelos meios televisivos. Mas encontrou-se um novo filão na multiplicação dos blocos locais, mais espontâneos e expressivos de grupos menores e menos custosos, que passam a receber suportes até oficiais. Mas as ricas raízes brasileiras encontram também espaços para serem merecidamente exaltados, como no artigo publicado pelo suplemento Eu & Fim de Semana, pelo credenciado Zuza Homem de Mello (http://www.valor.com.br/cultura/3447004/no-bloco-do-samba-cancao).
Zuza Homem de Mello tem uma longa e tradicional carreira de pesquisas e apresentações inteligentes do que existe realmente de importante na evolução da música popular brasileira, que apresenta agora não com a habitualidade desejada pelos seus velhos admiradores. Lembro-me de suas apresentações corriqueiras, ao vivo, há décadas, em estabelecimentos especializados, mas acanhados, ainda quando a Vila Madalena não contava com o prestígio atual. Suas histórias eram intercaladas por interpretações magníficas, quando os intérpretes ainda não contavam com generosos espaços nas mídias eletrônicas.
Zuza Homem de Mello, Lupicínio Rodrigues, Dorival Caymmi e Aracy de Almeida
É possível que haja um pouco do saudosismo, mas os especialistas concordarão que muitas das diferentes raízes da música popular brasileira estão em Lupicínio Rodrigues (1914-1974), Dorival Caymmi (1914-2008) e no Noel Rosa, cantado por Aracy de Almeida (1914-1988), cujos centenários estão sendo comemorados neste ano. Com o predomínio do samba canção.
A marca consagrada de Dorival Caymmi, que deixou uma grande herança entre os renomados baianos, é a praia, o mar e os cenários ensolarados da sua terra natal, parte importante do Nordeste e do Brasil, que deixa a marca de uma alegria descontraída que identifica os brasileiros e os diferencia de outros povos. O ritmo de suas memoráveis canções está embalado nas ondas do mar baiano. Uma coisa tão brasileira que vai se expressar no tropicalismo, mas que se consolidou no Rio de Janeiro recendo outras contribuições, na Capital do país na época.
Zuza Homem de Mello ressalta Lupicínio Rodrigues na sua inter-relação com Herivelto Martins, cantado por Francisco Alves, gerado no clima da boêmia dos cabarés gaúchos. Seu processo criativo explora os extremos da paixão e do ódio, os sentimentos da dor do cotovelo que influenciaram uma geração, e que estava no contexto do que ocorria na guerra e logo depois dela na Europa.
Mas já havia uma contribuição anterior consubstanciada por compositores, como Ary Barroso, que deixaram suas marcas com músicas que são cantadas até hoje, fazendo parte do que há de melhor no Brasil. E todas estas contribuições foram cantadas desde Francisco Alves e Jamelão, passando por Ciro Monteiro, Linda Batista, chegando até Elis Regina, Paulinho da Viola até Gal Costa.
Zuza Homem de Mello trabalhou com todos eles, conviveu e conhece profundamente o que aconteceu, podendo ser considerado ainda hoje a enciclopédia da música popular brasileira. E na trinca que passa pelo centenário, ele ressalta a importância de Aracy de Almeida que não deixou perder o que foi feito por Noel Rosa, esta consagrada contribuição do subúrbio carioca, quando o morro ainda não era ocupado pelas favelas.
Foram as gerações que permitiram monstros sagrados como João Gilberto e Antonio Carlos Jobim a contribuírem para a eclosão da Bossa Nova, que tornou o Brasil conhecido em todo o mundo.