Dificuldades dos Acadêmicos Com as Restrições Políticas
4 de outubro de 2016
Por: Paulo Yokota | Seção: Economia, Editoriais e Notícias | Tags: as criações de condições para aprovações políticas, dificuldades de propostas acadêmicas com as restrições políticas, insuficiência da racionalidade econômica
Ainda que existam muitos acadêmicos com algumas experiências do exercício do poder, nem sempre as dificuldades encontradas no campo político ou burocrático são consideradas com a devida importância.
A Praça dos Três Poderes em Brasília, onde estão presentes o Executivo, o Legislativo e o Judiciário
Ainda que a realidade nem sempre seja fácil de ser aceita com uma atitude pragmática, o fato concreto é que a história democrática do Brasil ainda é recente, estando num processo que se espera seja de aperfeiçoamento constante. Muitos bons acadêmicos brasileiros já estudaram tanto a nossa história quanto experiências acumuladas em outros países. Mesmo conscientes de que as versões oficiais prevalecentes do passado tenham suas falhas, não conseguem formular soluções aceitas pelos que detêm o poder. Já se afirmou que no Brasil até o passado é incerto, quanto mais o presente e o futuro, até porque muitos dados históricos foram coletados com metodologias duvidosas. Parece conveniente que nas propostas formuladas haja um mínimo de pragmatismo para conseguir os avanços possíveis no atual quadro político.
Quando se trata de debater a atual situação econômica, política e social, sempre existem as propostas honestas que muitos consideram racionais e justas, mas não são aprovadas porque não se questiona quais pontos de vista foram considerados. Nem sempre a racionalidade política é a considerada pelos teóricos. Notadamente, quando existe uma sobreposição de interesses que não se restringe ao Executivo, ao Judiciário e ao Legislativo isolados, nem sempre ficando claras as ligações existentes entre grupos interessados presentes em muitas posições diferentes, onde o setor privado representa o pano de fundo das prioridades desejadas da sociedade.
Beira a ingenuidade dos acadêmicos quando não se compreende porque os privilegiados de uma sociedade não aceitam aumentos de cargas tributárias, como as taxações das grandes fortunas que ajudariam no equilíbrio da carga tributária entre todos os contribuintes, ajudando a resolver um dos maiores problemas brasileiros atuais. Existem variadas formas nas entrelinhas das regulamentações que permitem aos que possuem grandes patrimônios evitem ser tributados, por melhor que sejam os mecanismos de cobrança dos impostos. Além da alegação que tais tributações dificultariam que estes aumentos de patrimônio sejam canalizados para os investimentos indispensáveis para a economia e a sociedade brasileira.
Muitos alegam que os ganhos de capital disfarçados por longos períodos quase sempre deixam de ser tributados, enquanto, de forma discrepante, os que possuem pequenos patrimônios ou rendas modestas não podem fugir das tributações que muitas vezes são descontadas nas fontes, como nas folhas de pagamentos ou nas compras que efetuam. Reconhecidamente, a carga tributária é pesada e mal distribuída, mesmo que os técnicos fazendários se empenhem em regulamentações mais equilibradas e equitativas, quando as medidas são submetidas às aprovações como do Legislativo, acabando por sofrer fortes resistências.
Muitos acadêmicos ficam abismados quando tomam conhecimento que impostos municipais como os que incidem sobre imóveis são cobrados somente nos grandes municípios, pois as autoridades locais preferem receber parcelas de fundos estaduais ou federal. Não desejam tributar diretamente os seus potenciais eleitores próximos, quando deveriam distribuir os tributos entre todos os contribuintes de forma razoável.
Seria interessante que muitos acadêmicos com as melhores intenções tivessem experiências na execução de tarefas para constarem pessoalmente as resistências existentes. Sabe-se que o próprio Judiciário, por não contar com prazos máximos para julgamento de muitos processos, acaba utilizando o tempo como forma de beneficiar até os que cometem irregularidades. É famoso o caso de grilagem de terras da reserva florestal do Pontal de Paranapanema no Estado de São Paulo, que não apresenta prosseguimento, ainda que reconhecido por todos como uma irregularidade, que acaba estimulando novas invasões por parte dos sem terras. Este é um exemplo entre milhares de outros semelhantes.
Existem processos, como já mencionados neste site, que tiveram decisões liminares pela unanimidade de ministros do Supremo Tribunal Federal, mas não são colocados para decisões no mérito por afetarem potencialmente os interesses da Fazenda Nacional. Seria infindável continuar a listar graves distorções desta natureza com as quais os acadêmicos certamente se revoltam, mas que fazem parte da realidade brasileira.
O que parece indispensável é que haja um mínimo de pragmatismo para efetuar o que é possível e não o que seria desejável. Os economistas desenvolveram o conceito de Second Best, reconhecendo que nem sempre é possível fazer o melhor. Faz-se o possível para avançar num mundo onde os variados interesses nem sempre permitem que a solução seja alcançada.
Isto não significa que está se abandonando a perseguição do que seria considerado justo, mas deve-se reconhecer que também essa justiça comporta variadas avaliações. Se possível, ótimo. Mas, quando não é possível, é preciso continuar persistindo, aperfeiçoando sempre que possível, pois se trata de um longo processo com as mais inusitadas participações nem sempre são consideradas pelos melhores acadêmicos que, para deixarem claras as suas teorias, utilizam modelos simplificados. A dura realidade costuma ser muito complexa.