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A Pressa é Inimiga da Perfeição Também na Segurança Pública

19 de fevereiro de 2018
Por: Paulo Yokota | Seção: Cultura, Editoriais e Notícias | Tags: aspectos que devem ser considerados na segurança pública, diferenciação entre soluções emergenciais e de efeito permanente, necessidade de um ponto de inflexão, problemas que já se tornaram parte da cultura brasileira, sendo mais graves do que em muitos outros países

O problema da deterioração da segurança pública no Brasil parece ser um fenômeno que vem se agravando ao longo de muitas décadas, com uma tolerância generalizada aos crimes relacionados com o tráfico de drogas e corrupções em diversos níveis, aparentando já fazer parte da cultura brasileira. Parece uma ingenuidade imaginar que num prazo menor a um ano, com alçada restrita ao setor de Segurança Pública, um interventor vá conseguir alterar o quadro, mesmo com o envolvimento dos militares que não foram treinados para tanto, quando muito só seria possível estancar que continuemos indo ladeira a baixo. Mesmo não desejando ser pessimista, o quadro se assemelha quando os políticos acabaram envolvendo os militares na implantação do regime autoritário em 1964, deixando que as responsabilidades do insucesso voltem a ficar com eles.

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General Braga Neto, primeiro à esquerda, um dos mais qualificados e condecorados militares com longas experiências no Brasil e no exterior, foi nomeado interventor de Segurança Pública no Rio de Janeiro

Todos sabem que as maiores vítimas da guerra provocada por facções de criminosos ligados à droga no Rio de Janeiro que acabou por se estender por todo o país, como o presidente Michel Temer chamou de “metástase” de câncer, estão nas favelas e outras regiões onde o Estado não consegue atender aos mais necessitados. A Saúde, a Educação e todos os demais serviços sociais não chegam como deveriam nestas áreas, mas elas ainda continuarão dependendo do governador do Estado que prometeu todo o apoio que não tem sido eficiente. Também não são problemas que podem ser resolvidos em meses, com as limitações de recursos hoje existentes, ainda que estas áreas sejam consideradas prioritárias. Modificar a cultura que se formou e que envolve todo o país não é uma tarefa fácil, pois alguns dos líderes de criminosos estão em prisões em outros Estados, onde não se consegue que as comunicações por celulares acabem sendo impossíveis com os seus liderados. Também pesados armamento têm chegado do exterior para equipar os criminosos até melhor que os militares.

Quando o governo tomou a decisão sobre esta intervenção, uma notícia divulgada pelo Globo News informa que houve uma forte restrição da parte de alguns que tiveram se curvar à decisão do presidente, como se houvesse uma unanimidade clara. Mesmo que todos concordem que algo teria de ser feito, observa-se que muitos aspectos importantes das formas de atuação ainda não estão claros sequer para os diretamente envolvidos. A relatora da matéria para a decisão na Câmara dos Deputados reclama que não recebeu ainda os dados que fundamentam o decreto de intervenção, que terá que ser decidida por maioria simples também pelo Senado.

A pressa e a emergência não justificam projetos mal elaborados que aumentam as dificuldades para o sucesso das medidas, que já estão sendo complementados pela possibilidade de criação de um Ministério Extraordinário de Segurança Pública. Não há notícias que especialistas destes assuntos estejam sendo ouvidos, restringindo-se aos políticos, onde poucos estão especializados nesta matéria.

Todos sabem que estes problemas são extremamente complexos, não havendo um razoável consenso das melhores estratégias. Mas existem experiências que obtiveram bons resultados em algumas regiões de outros países, mesmo sabendo as situações se diferenciam de um lugar para outro. A intervenção é uma medida extrema e um fracasso só pode agravar o problema, mesmo que num período haja um arrefecimento das violências, o que não pode ser considerado um sucesso. Um exagero na consideração política não parece ser o cuidado a ser considerado, até porque os políticos estão desmoralizados e às vésperas de uma eleição.

Mesmo que se informe que o interventor possui um doutorado em questões políticas, tendo já demonstrado habilidade no diálogo com outras autoridades, não se pode imaginar que seria uma andorinha que anuncie a mudança da estação. O assunto exige uma grande equipe para atuar em muitas frentes, sendo natural que muitos deles sejam militares, que não costuma e nem deve ter a flexibilidade exagerada dos políticos.

Quem já teve experiência para atuar em setores onde os militares são ativos, sabe que a hierarquia para eles é de vital importância e sempre há necessidade de conversar com todos os escalões para que se chegue às formas que eles aprenderam como o sistêmico que denominam de Estado Maior, que tem se revelado eficiente ao longo do tempo. Espera-se que o interventor tenha condições de recrutar pessoas capacitadas na obtenção de informações, contar com as logísticas necessárias e responsáveis pela atuação nas operações, mesmo dentro dos quadros desmoralizados das polícias civis e militares do Rio de Janeiro, contando com a retaguarda prometida pelo governo federal para a articulação adequada com os outros Estados brasileiros.

Haverá sempre a necessidade da velocidade inicial da cavalaria (hoje motorizada) com o apoio da artilharia para um primeiro ataque aos problemas com comunicações tecnologicamente avançadas, mas depois da infantaria para uma longa ocupação do espaço até se conseguir uma razoável mudança da cultura hoje existente no Brasil sobre a Segurança Pública.

Seria desejável que os políticos tivessem o mínimo destes conhecimentos para que os militares fossem utilizados com eficiência para as atividades para os quais foram treinados. Mas a exposição deles aos contatos com os criminosos por longo tempo apresenta elevado risco de alguns serem corrompidos pelos volumosos recursos ilícitos que utilizam nas suas atividades criminosas. Pois os militares também são humanos.