Donald Trump Propõe um Absurdo no Comércio Internacional
9 de março de 2018
Por: Paulo Yokota | Seção: Economia e Política, Editoriais e Notícias | Tags: espera-se a mudança desta política, o número deste fim de semana do The Economist, prejudicando os Estados Unidos e o mundo | 2 Comentários »
Até o principal assessor econômico de Donald Trump, Gary Cohn, pediu demissão, pois ninguém que entenda um mínimo de economia pode propor o aumento de tarifas como do aço e do alumínio, o que acaba prejudicando os próprios produtores norte-americanos que utilizam estes produtos e se tornam menos competitivos no mercado mundial.
A capa do novo número do The Economist mostra que o presidente norte-americano está provocando uma nova guerra comercial insensata no mundo
Mesmo os assessores econômicos mais insensatos do presidente dos Estados Unidos não devem concordar com o que foi anunciado, mas até agora não foi efetivado. Espera-se que se encontre uma saída para este equívoco para se evitar a eclosão de uma guerra comercial no mundo, onde não haveria nenhum país que tiraria vantagem da situação.
A OMC – Organização Mundial de Comércio nasceu na esperança que o mundo globalizado proporcionaria vantagens para todos na medida em que comércio internacional aumentaria, fazendo com que as produções mais eficientes pudessem distribuídas por outros países. Já havia uma dificuldade com a China que, apesar de fortes intervenções governamentais beneficiando algumas de suas atividades, forçou que fosse reconhecido como uma economia de mercado. Antes da OMC já havia diversas tentativas de ir aperfeiçoando o comércio internacional, inclusive na concessão de patentes sobre tecnologias desenvolvidas pelos países membros.
Os norte-americanos encontraram uma brecha para impor impostos de importação de 25% sobre o aço e 10% sobre o alumínio, com Donald Trump afirmando que as importações estão prejudicando o emprego nos Estados Unidos, alegando questão de segurança nacional. Alguns assessores como parlamentares republicados não concordam com a medida que pode caminhar para uma escalada protecionista. Já existem oposições de outros parceiros no mundo, como a União Europeia que pode impor medidas não tarifárias que prejudiquem a colocação de produtos agropecuários dos Estados Unidos na Europa, mas que podem redundar em muitos processos de longo julgamento aumentando a incerteza econômica no mundo.
Ninguém pode negar que a OMC tenha seus problemas, mas, se ocorrer esta escalada previsível, sua utilidade estará questionada. Estaria se retrocedendo por décadas, voltando à política mercantilista do passado distante, com a força militar prevalecendo a racionalidade de algumas regras, segundo o artigo do The Economist. O que poderia restar seriam alguns acordos regionais de menor importância.
Até o momento não se visualizada medidas grupais que procurem minorar as brutais restrições que estão à caminho, que se original pelo homem que ocupa a Casa Branca.
NÃO É MERO PROTECIONISMO!
Algumas notícias que surgiram na política internacional neste mês nos mostram muito sobre o futuro geopolítico do planeta.
Primeiro, o Partido Comunista da China anunciou a abolição do limite de mandatos para o presidente Xi Jinping, deixando o caminho aberto para a sua perpetuação no poder. Vale destacar que no último congresso do partido, Xi já havia avançado com a incorporação de sua ideologia na constituição do país, o deixando no mesmo patamar de Mao Tsé-Tung.
Depois, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou tarifas de 25% e 10% para as importações de Aço e Alumínio, respectivamente. A medida vem dias depois de Trump anunciar que Peter Navarro, um dos teóricos mais respeitados que condenam a expansão chinesa, será um conselheiro e assistente direto do presidente. O que poucos conseguem captar através desses sinais é que eles estão correlacionados.
Trump mudou todo o cenário geopolítico através de uma plataforma de energia independente estratégica:
Ao cortar regulações e impostos, liberando a produção energética norte-americana, que está prestes a se tornar líder mundial em produção de petróleo.
A aproximação com a Arábia Saudita e países do golfo.
Retirando os EUA do acordo climático de Paris.
As negociações com Theresa May em um acordo bilateral com o Reino Unido.
A exportação de carvão para o Reino Unido e França.
Acordo com a Irlanda para exportação de grandes quantidades de Gás Natural Liquido (GNL) do Texas.
Trump utilizou todas essas medidas para baixar os preços mundiais de energia e impactar adversários como a Rússia e China. Por exemplo, ao exportar energia para a Europa Ocidental e Oriental, Trump libera esses países da influência e dependência russa.
Com eleições próximas, Vladimir Putin teme pelo seu poder doméstico, que depende exclusivamente de uma retórica agressiva e anti-Ocidental. E, por isso, vimos nos últimos meses e semanas, o aumento da propaganda militar russa, anunciando diversas armas do “fim do mundo”, mas que não foram apresentadas e, muito provavelmente, nem testadas.
No caso da China, sua admissão ao sistema de comércio internacional pelos Estados Unidos e pelo Ocidente, através da entrada chinesa na OMC, em 2001, apenas permitiu que o regime chinês se tornasse mais bem financiado e dotado de recursos, enquanto ao mesmo tempo exporta o autoritarismo e expande sua agressão militar.
Os líderes chineses consideram o comércio e o investimento como domínios de competição estratégica e não uma simples cooperação vantajosa para todos os envolvidos, pensamento exclusivamente ocidental.
A China utiliza de práticas predatórias e desleais quando se trata de comércio, mas é a Coréia do Norte a arma chinesa mais poderosa para alavancar sua economia e sua política de comércio. Embora a Coréia do Norte seja tecnicamente um estado-nação independente, na realidade, e em termos econômicos, a Coréia do Norte é mais precisamente definida como uma província chinesa e não uma nação independente.
O que a China autoriza Kim Jong-Un a fazer, Kim Jong-Un faz. “Caro Líder” Kim Jong-un é melhor descrito como um governador provincial, que serve a uma função muito específica de ferramenta contra o Ocidente.
Pequim vem utilizando dessa arma a muito tempo. Quando Obama tentou negociar o déficit comercial entre os dois países e tentou ser rigoroso com os chineses (assunto de muitos de seus debates com Mitt Romney), a China autorizou a Coréia do Norte a iniciar uma das maiores crises das últimas décadas na região, afundando uma fragata sul-coreana e abrindo fogo de artilharia contra ilhas do país vizinho. Quando Pequim sente o aperto, eles dizem a Kim Jong-un para agir.
Mas Trump foi eleito e podemos dizer que a eleição do bilionário de Nova Iorque foi o pior pesadelo para Pequim e Pyongyang. Atualmente, toda vez que Kim Jong-un age, o presidente Trump ameaça Pequim com pressão econômica. É só lembrar quando Trump pedia ajuda chinesa com a Coréia do Norte e dizia que Pequim poderia fazer muito mais em relação a esse problema. A resposta sempre era agressão retórica norte-coreana e teste de mísseis ou nuclear. A China escolheu agir como sempre, mas foi desafiada como nunca. Pequim encaixou-se neste ciclo inescapável.
Durante esse período, Washington iniciou investigações contra os chineses nas áreas de Aço, Alumínio e roubo de propriedade intelectual, utilizando-se da seção 301 da USTR (Representação comercial dos Estados Unidos), aumentando a pressão sobre o presidente chinês Xi Jinping. Mas, mais especificamente, essa ação ataca a antiga guarda comunista de Pequim que controla sua economia e o comportamento da Coréia do Norte.
A China tem centenas de bilhões de dólares em superávit comercial com os Estados Unidos e o acesso ao maior mercado consumidor do mundo é o que move grande parte da economia chinesa. Isso explica por que a China vem utilizando um adversário geopolítico (Coréia do Norte) para fazer os Estados Unidos cooperarem economicamente com um regime inimigo e comunista (China). É assim que esse jogo geopolítico funciona. A alavancagem americana é o seu mercado e o seu comercio com os chineses. A alavancagem chinesa é o Rocket Man (Trump é um excepcional criador de apelidos).
Trump tem utilizado de um discurso militar forte (quando diz que está opção sempre está na mesa) e de uma blitzkrieg diplomática, utilizando-se de sanções para apertar a economia norte-coreana, atingindo também empresas chinesas ligadas ao regime que mantém o Rocket Man vivo. E, claro, Pequim quer impedir os esforços diplomáticos. Mesmo que a China controle grande parte do pântano de Washington por meio de atividade de lobby, eles não podem controlar Trump e certamente não podem controlar a abordagem diplomática de Trump para envolver um governo estrangeiro. Portanto, a posição padrão chinesa seria que a China controle qualquer encontro entre os EUA, a Coréia do Sul e/ou Japão, com Kim Jong-un. Trump sabe que seria contra os interesses de Pequim que as negociações diplomáticas avançassem, pois isso poderia enfraquecer a barganha que Pequim detém.
Você consegue enxergar onde Trump chegou? Rússia e China foram atraídos para um espaço de batalha econômica controlado pelos EUA. O presidente Trump pode oferecer um resultado comercial melhor para a China, se eles cumprirem as sanções da ONU. Do mesmo modo, o presidente Trump pode negociar com a Rússia em termos “melhores” ou “mais favoráveis” a exportação de energia dos EUA para a Europa, novamente se a Rússia cumprir as sanções da ONU.
Toda essa compreensão das movimentações geopolíticas desses países e de seus líderes específicos nos ajuda a entender porque o Partido Comunista Chinês elevou Xi a um patamar só pertencente a Mao. O governo Trump encurralou o regime e o seu objetivo de ser a potência hegemônica global e por isso o PCC agiu por ampliar os poderes de Xi, confiando que ele será capaz de superar esses objetivos por ter amplos poderes.
Trump observou as sinais dados pela ditadura chinesa e anunciou as tarifas sobre o Aço e o Alumínio, produtos que fazem parte do leque chinês de exportação para o mercado dos EUA. O que provavelmente dará inicio a uma guerra comercial entre os dois países. Guerra, esta, que Trump disse ser boas e facilmente ganhas.
O anuncio das tarifas, porém, é apenas a primeira fase do plano de Trump para a guerra comercial contra a China. A segunda fase é mais ampla e, consequentemente, muito mais importante para o jogo geopolítico: A saída americana do NAFTA.
Quando as rodadas de renegociação do NAFTA começaram entre seus três participantes, observei que só haveriam duas saídas para o bloco:
Opção 1: Renegociar o acordo e eliminar as lacunas utilizadas por outros países para adentrar o mercado americano através do México e Canadá sem enfrentar os EUA bilateralmente. Isso exigiria que o Canadá e o México concordassem com regras muito específicas introduzidas no acordo pelos EUA, que eliminariam a capacidade dos países terceiros explorar o vazio comercial atual. O Canadá e o México teriam que concordar com essas regras, consequentemente perdendo dinheiro e barganha comercial. É contra seus interesses removê-lo. Sabendo que era contra seus interesses, Trump nunca imaginou que Canadá ou México concordassem, mas ele estava disposto a descobrir.
Opção 2: Sair do NAFTA. E, posteriormente, lidar com o Canadá e o México individualmente com acordos comerciais estruturados sobre suas importações. O Canadá e o México poderiam fazer o que quiserem, mas cada acordo comercial bilateral dos Estados Unidos seria escrito com a intenção de remover a facilidade que terceiros tem de utilizar o NAFTA.
Trump sempre esteve decidido a sair do NAFTA, porque o maior perdedor de uma retirada americana do NAFTA seria a China, não Canadá ou México. A China.
O problema essencial do NAFTA é que o acordo tornou-se uma porta aberta para exploração do mercado interno americano. Se as tarifas não existem entre Estados Unidos, México e Canadá, por que um terceiro iria negociar um acordo com os americanos, se pode obter um acordo melhor, custos menores e condições infinitamente mais favoráveis de seus dois vizinhos e ainda ter acesso irrestrito ao maior mercado consumidor global?
Através de um processo de construção, montagem ou fabricação de seus produtos no México/Canadá, essas empresas estrangeiras podem ignorar as tarifas comerciais dos EUA e os acordos comerciais diretos com os EUA. Assim, os produtos estrangeiros acabados entraram nos EUA sob as regras do NAFTA e não nas regras originais de um acordo que o país natal dessa empresa tenha com os EUA.
Por que lidar com os EUA quando você pode lidar com o México e usar as regras do NAFTA para enviar seu produto diretamente para o mercado dos EUA? Muitos países protegem a sua economia de produtos americanos mas utilizam Canadá e México para adentrar os EUA sem pagar tarifas, pois detém acordos econômicos mais favoráveis com os vizinhos.
Por exemplo, uma das questões mais controversas nas rodadas de negociações entre os três países tem a ver com a forma como os carros são fabricados. No NAFTA, é chamado de “regras de origem”. A regra determina a parcela de um produto que deve ser fabricado na América do Norte para evitar impostos de importação.
De acordo com as regras atuais, pelo menos 62% das peças devem vir da América do Norte. Não importa se as peças do automóvel são fabricadas no México, no Canadá ou nos Estados Unidos, desde que tenham sido produzidas na América do Norte. Os EUA propuseram elevar esse limite para 85%. Os EUA também propuseram que metade das partes provenientes da América do Norte sejam originárias dos Estados Unidos.
Esta lacuna foi o principal motivo para que os fabricantes dos EUA mudassem suas fabricas automobilísticas para o México. Essas empresas poderiam aumentar os lucros construindo no México ou no Canadá utilizando peças importadas da Ásia (China).
É por isso que o discurso de Trump leva sempre a frase “estão levando vantagem”. Por que enviar diretamente para os EUA, ou fabricante dentro dos EUA, quando você poderia simplesmente montar no México e no Canadá e usar NAFTA para trazer seus produtos para o objetivo final, o enorme mercado dos EUA?
O presidente Trump está usando o exemplo do aço e alumínio para destacar a falha do NAFTA. O Canadá e México não estão entre os maiores produtores de Aço, mas representam mais de 25% de todo o Aço que os EUA importam. A resposta é simples, não é aço mexicano e canadense que os EUA importam, e sim aço chinês, que se utiliza do NAFTA para entrar no mercado americano.
Infelizmente, Wall Street e as multinacionais não reagirão bem, pois elas são as maiores perdedoras caso Trump se retire do NAFTA. A Câmara de Comércio dos EUA, por exemplo, é financiada por grandes corporações multinacionais e está gastando centenas de milhões de lobby no congresso para manter o NAFTA. Além disso, com o Canadá se mantendo no TPP, tornou-se impossível que os EUA permaneçam no NAFTA e simultaneamente realizem negociações comerciais bilaterais com países do TPP.
Porém, Trump não precisa de aprovação do congresso para uma retirada. O artigo 2205 do NAFTA, que Trump citou em seu discurso na semana passada em Pittsburgh, tem apenas 34 palavras e simplesmente diz que uma parte pode se retirar do acordo seis meses após a notificação por escrito.
O presidente Trump não diferencia sua política de comércio com a de segurança nacional. E isso é algo que grande parte da mídia ocidental, americana e, obviamente, brasileira, não consegue perceber. Seus movimentos geopolíticos e comerciais desde que assumiu o cargo estão extremamente relacionados e dependentes um do outro. China e Rússia são duas das maiores ameaças à segurança nacional dos EUA e Trump utiliza do comércio para enfraquecer os seus inimigos e alavancar a posição americana.
Fonte:http://renovamidia.com.br/opiniao-nao-e-mero-protecionismo/
Caro José da Silva,
Seu longo comentário pode se aceito por alguns, mas é muito perigoso ser o único dono da verdade.
Paulo Yokota