O Brasil Não Pode Brincar com a China
2 de novembro de 2018
Por: Paulo Yokota | Seção: Economia e Política, Editoriais e Notícias | Tags: a China já passa por um processo de desaceleração da sua economia, grandes compradores de minérios e produtos agropecuários do Brasil, importância dos recados chinee é do Estado não é de governo, os maiores investidores em projetos de geração e distribuição de energia elétrica
O Brasil não pode se dar ao luxo de considerar neste momento levianamente a advertência que está recebendo da China sobre os riscos de adotar uma política externa semelhante a que Donald Trump com relação àquele país. O embaixador chinês em Brasília já registrava que o brasileiro pouco conhece a China e a advertência estampada recentemente no China Daily é coisa muito séria. Urge designar com a máxima urgência um novo ministro das Relações Exteriores que deixe claro qual a política externa que vai ser adotada pelo governo eleito. Um nome que poderia ser cogitado pela sua alta qualificação para chanceler é do embaixador Sérgio Amaral (foto), que já foi ministro de Indústria e Comércio, embaixador em Londres e atualmente comanda a embaixada de Washington e que foi presidente do Conselho Empresarial Brasil-China, um dos nomes mais brilhantes do Itamaraty, muito familiarizado com os problemas chineses.
A China importou do Brasil no ano passado mais de US$ 58 bilhões, com destaque para cereais como a soja e o milho, carnes de diversos tipos, além dos minérios como de ferro. Com os atuais atritos comerciais com os Estados Unidos, a tendência é que estas importações continuem aumentando e os chineses efetuam investimentos no Brasil visando este objetivo. No que se refere aos investimentos chineses no exterior, em 2017 já superaram a US$ 20 bilhões anuais no Brasil e continuam aumentando, principalmente na geração de energia elétrica e sua distribuição.
Estes dois aspectos são vitais para as relações bilaterais dos dois países e vieram estabelecendo uma das cooperações mais significativas para o desenvolvimento brasileiro, que continuará necessitando tanto de mercados para seus produtos como investimentos em infraestrutura no Brasil, para os quais os recursos internos são insuficientes.
É evidente que a economia chinesa já vem reduzindo o seu ritmo de desenvolvimento econômico nos últimos anos, o que tende ainda a continuar baixando, mas ainda estará entre os mais elevados no mundo, notadamente nos países emergentes. Num momento crucial para ambos os países, o Brasil não pode vacilar, gerando desconfianças que são permitidas somente para leigos, mas exigem fortes determinações das autoridades, por serem todos de longo prazo. Os chineses até entendem que nas campanhas eleitorais algumas afirmações sejam feitas, mas em se tratando de governo, a situação é completamente diferente.
As preocupações da política externa brasileira não se resumem somente à China. Uma eventual preferência brasileira com relação a Israel, por exemplo, pode afetar os intercâmbios brasileiros com o Oriente Médio, notadamente os países árabes e o Irã, exigindo as devidas cautelas. Estes assuntos não são somente do governo, mas podem ser considerados do Estado, por terem repercussões por muitas décadas, tendo já exigido trabalhos diplomáticos contínuos ao longo dos anos. Somente um profissional qualificado no Itamaraty poderá evitar o que se registrou em alguns governos passados, onde assessores do presidente tomavam decisões que refletiam preferências ideológicas, como a assistência à Venezuela e a Cuba.
O Brasil é um dos países que vinha praticando uma política externa independente dos Estados Unidos, com uma visão ampla e diversificada em todo o mundo. Atualmente, começam a aumentar as tensões militares com o aumento do armamento. O Brasil precisa definir sua eventual posição nestes assuntos.
Jair Bolsonaro já manifestou que pretende uma política externa pragmática, considerando os interesses brasileiros com todos os países, na medida em que possam, mesmo em longo prazo, proporcionar vantagens ao Brasil. Existem outros assuntos, como os relacionados com o aquecimento global discutido no Acordo de Paris, e outros comércios no âmbito da OMC – Organização Mundial do Comércio, onde o papel do Brasil é relevante como parte de sua política externa. Também existem acordos de livre comércio entre blocos de outros países que precisam ser estudados em profundidade. O Brasil necessita de um Itamaraty contando com profissionais altamente qualificados nestes assuntos diplomáticos, que não são para leigos ou políticos.