Sobre os Resultados da COP 10 em Nagóia
30 de outubro de 2010
Por: Paulo Yokota | Seção: Integração | Tags: a versão da agência Kyodo com base na leitura japonesa, a versão do site da Globo com base na leitura brasileira, formas de ver os resultados de Nagóia | 4 Comentários »
A imprensa mundial relatou os esforços que representantes de cerca de 200 países realizaram ao longo de 10 dias, procurando chegar a um acordo global sobre a preservação da biodiversidade, bem como os mecanismos para tanto, além das formas de seu financiamento. A versão sobre a reunião que está reproduzida no site da Globo parece refletir o ponto de vista dos países que possuem uma grande biodiversidade, desejam mantê-la e procuram dividir os seus custos com os países desenvolvidos que aproveitam estes recursos para diversas finalidades, como a produção de medicamentos.
O ponto de vista expresso pela agência Kyodo, bastante divergente da primeira, parece refletir o ponto de vista do país sede, o Japão, que, além de colocar alguns recursos para estes programas, deseja que o evento seja considerado um passo positivo para futuros entendimentos.
Ministro japonês Ryu Matsumoto no telão durante convenção em Nagóia
O site da Globo expressa que não houve um acordo, informando que os países saíram da reunião COP 10 divididos, pois os delegados brasileiros estavam pessimistas desde o início da reunião, ameaçando boicotar outros entendimentos internacionais, para forçar resultados positivos.
Países como o Brasil desejavam metas ousadas para 2020, e o que ficou acertado é entendido como modesto, sendo que o texto final acabou ficando vago, retirando aspectos mais controvertidos. Pretendia-se fixar 20 itens, relacionados com a repartição dos benefícios, manutenção dos estoques pesqueiros, dos habitats naturais, estabelecimentos de reservas terrestres e marítimas. Entendia-se que deveria haver um protocolo da ONU estabelecendo a participação dos países que contam com tais biodiversidades nos benefícios que pudessem ser proporcionados por eles, definindo-se as suas origens, fornecimentos e os países desenvolvidos deviam arcar com os custos da manutenção destas reservas.
A versão japonesa é que se fixou o princípio da divisão dos benefícios, estabeleceram-se metas de 17% das reservas terrestres e 10% das reservas marítimas, e que se estabeleceu um “go ahead” para a discussão dos mecanismos de financiamento, ajudando os menos desenvolvidos a atingirem as metas estabelecidas.
A proposta da Comunidade Europeia era a aprovação do bloco dos três aspectos em conjunto, mas alguns países preferiam a sua discussão em separado. Um aspecto que gerou controvérsias foi a retroatividade destes entendimentos para o passado, onde os desenvolvidos entendiam que seus custos eram impossíveis de serem arcados, por exemplo, pelos medicamentos.
Todos concordaram que nova reunião será realizada em 2012 em Nova Delhi, na Índia. O que parece possível se concluir é que houve um acordo mínimo para considerar que houve avanços, ainda que muitos países tenham saído insatisfeitos, até porque metas que estavam estabelecidas para 2010 não foram cumpridas. O que parece consensual é que a biodiversidade tornou-se um assunto que merece a atenção de todos.
Paulo, interessante ver seu comentário, pois se contrapõe à posição que o Brasil manifestou através da Assessoria de Imprensa do MMA. A Ministra e os outros negociadores se dizem satisfeitos com o acordo. Além disso, nas coletivas de imprensa que o Brasil ofereceu em Nagoya (vi todas online), os representantes não pareciam otimistas. O discurso de bloqueio, a meu ver, pareceu mais uma posição que coaduna com a atual política externa do Governo brasileiro: ganhar espaço e mostrar que somos grandes não só na extensão territorial, mas na força também.
Bom, temos um Núcleo de Estudos Internacionais na Faculdade de Direito da USP (organizado por estudantes) e, dentro dele, temos um observatório de política externa brasileira. Estamos preparando um informe especial com análises da CDB e da COP/MOP. Gostaria de deixar o link para o post introdutório: http://neiarcadas.wordpress.com/?p=1618&previ…
Abraços!
Cara Maybe Mota,
Muito obrigado pelos comentários. Já examinei o site que V. indicou, e gostaria de parabenizá-los pela iniciativa.
O que posso acrescentar é que chefiei algumas missões brasileiras nas reuniões de entidades mundiais. Nestes eventos, mesmo que haja um fracasso total, costuma-se publicar um comunicado procurando aspectos que sejam considerados avanços, mesmo que sejam ligeiros e gerais. Os competentes diplomatas que nos assessoram são especialistas em negociações que se repetem em muitas reuniões. Mesmo quando existem alguns entendimentos comuns, há grandes dificuldades para se tornarem operacionais, principalmente quando há necessidades de recursos substanciais, que precisam ser desembolsados por alguns países desenvolvidos.
O Japão, como sede da reunião, prometeu alguns poucos, mas sempre insuficientes, e todos os países lutam com suas dificuldades, mesmo que desejem colaborar na preservação da biodiversidade. Lamentavelmente, a longa experiências com assuntos correlatos nos torna cínicos, ainda que ache que países como o Brasil contam com apreciáveis biodiversidades que não conseguimos transformar em fontes de receitas, como na produção de medicamentos.
De qualquer forma fico muito satisfeito que estudantes de direito se interessem por estes assuntos, pois existe muito futuro nesta área, mas conseguimos aproveitar muito pouco no Brasil, por exemplo, dos chamados créditos de carbono. No que puder estou disposto a ajudá-los, pois sou um dos brasileiros que percorreu o maior número de lugares, desde os confins da Amazônia, Cerrados, Agreste nordestino, campos do sul, fronteiras como nosso pantanal, o que restou da Mata Atlântica etc. E também, por razões profissionais, conheci os Estados Unidos de cabo a rabo, trabalhei na Europa, executei projetos na África, e atuei em muitos países asiáticos, ao longo de minha vida.
Para começar, tenho a impressão que poucos brasileiros conhecem o Brasil, e o que estão nos livros não correspondem exatamente às verdades, mesmo com os levantamentos efetuado pelos satélites. Eu conheço mais que 40 Amazônias diferentes, terras baixas e altas, vales diferentes, confins do Acre ou de Roraima, a Perimetral Norte, a Transamazônica, trabalhei muito em Rondônia, no sul do Pará, no norte de Mato Grosso etc. Poucas visitas a algumas localidades não permitem uma generalização criminosa como muitos pseudos cientistas fazem, lamentavelmente.
Estou convencido que temos uma das maiores diversidades do mundo, pois conhecí florestas no Sudese Asiático, áreas que foram devastadas pelos europeus, como muitos rincões no Extremo Oriente, ou algumas reservas dos Estados Unidos. Manté-las vai depender muito de nossos esforços, pois trabalhei com o Banco Mundial, com o BID, com a FAO etc. e conheço as limitações deles, bem como das ajudas dos países chamados desenvolvidos, que são poucas.
Abraços, com a esperança que conheçam “in loco” as nossas biodiversidades.
Paulo Yokota
Apenas corrigindo:
*Não pareciam pessimistas.
Cara Maybi Mota,
Obrigado pela observação, e envio os meus comentários mais amplos sobre o outro que V. teve a gentileza de enviar.
Paulo Yokota