Tributo a Pina Bausch
2 de março de 2012
Por: Paulo Yokota | Seção: Depoimentos | Tags: documentário, Pina 3D, Wim Wenders
Nunca entendi muito a dança contemporânea, mas Pina Bausch em pessoa explica que a dança começa exatamente aí mesmo, onde termina a possibilidade das palavras. Palavras evocam coisas, mas quando se entra no campo onde as palavras não alcançam, não existem mais coisas nítidas e bem definidas: apenas a vaga noção de sentimentos, emoções e pensamentos.
É quando se deixa de questionar os movimentos corporais e se passa a apreciar apenas o efeito visual desses movimentos que começa a fruição da dança contemporânea, e a se perceber as sensações exprimidas pelos movimentos. O trabalho de Pina mostrado no filme impressiona pelos dois lados: a vivacidade rítmica rica, criativa e intensa, mas meramente visual, e as recorrentes sensações de angústia e vazio. Segundo Pina, tais sensações estão relacionadas com o objeto central da alma humana que é a eterna busca, o desejo. Objetivos que movem o ser humano nada mais são que camuflagem para justificar e direcionar um insaciável estado de desejo, profundo e permanente, que provém do vazio e resulta em eterna angústia.
O filme deveria ser documentário sobre o trabalho da revolucionária coreografia de Phillipine Bausch, mas com sua morte precoce aos 68 anos, em 2009, se tornou um tributo. Dirigido por outro aclamado alemão, Wim Wenders, o filme intercala o registro de algumas importantes coreografias com depoimentos e comentários dos integrantes da sua companhia, o Tanztheater Wuppertal. Os relatos são falados na língua natal de cada um. Há de diversas nacionalidades: espanhola, italiana, alemã, japonesa, chinesa e brasileira, entre outras. São pessoas retraídas, inaptas para expansões verbais, mas que cresceram com a dança, e se expandiram de forma intensa e gigantesca. O efeito tridimensional, em muitas cenas, dá mais vida. Intensidade de vida é justamente a essência do filme: filmado a dez metros de distância, vemos a expressão da dança no corpo dos bailarinos; a dois metros de distância, ela flui pelo corpo de cada bailarino; e filmado a vinte centímetros, a expressão da dança flui pela boca, olhos, testa e dentes do bailarino. Compreendemos finalmente que a dança ocorre no íntimo da alma daquela pessoa.
Embora “Água”, seu último grande trabalho inspirado na sua passagem pelo Brasil, não esteja citado explicitamente, Caetano Veloso, seu interlocutor no país, está lá na música e na forma de Leãozinho, coreografado por um dos principais bailarinos do corpo.
São duas horas de filme que passam com uma leveza surpreendente. A pungência bauschiana é de pesado e denso expressionismo alemão. Mas o entremeio, com lúdicos esquetes dos bailarinos, são brincadeiras executadas com virtuosismo de precisão alemã, sobre uma variedade que vai da MPB a músicas eletrônicas. Logo na primeira cena podemos pensar, “Ihhh, é dança contemporânea”. Mas ao final saímos sabendo apreciar um pouco mais o gênero. Uma verdadeira aula. Com Pina Bausch.