O Caminho Perigoso de Atritos do Presidente com a Imprensa

30 de abril de 2020
Por: Paulo Yokota | Seção: Editoriais e Notícias | Tags: artigo sobre o assunto de Ricardo Della Coletta no site da Folha de S.Paulo de hoje, os constantes atritos do presidente Jair Bolsonaro com a imprensa, reclamações do presidente de que suas declarações são deturpadas pela imprensa | 6 Comentários »

Mesmo que a imprensa brasileira passe atualmente por um período econômico-financeiro difícil, como muitas outras empresas privadas do Brasil, há que se constatar que ela procura manter a sua função, mesmo não contando com muitos jornalistas experientes de altas remunerações. Que se cometam alguns erros parece inevitável, como a posição da TV Globo possa ser considerada exagerada por muito no conjunto da mídia brasileira ao longo de décadas. Mas o presidente, com suas muitas declarações bombásticas no seu próprio estilo, acaba estimulando colocações que nem sempre lhes são simpáticas e não são de sua discutível preferência pessoal ou do seu grupo. 

Uma das entrevistas matinais do presidente Jair Bolsonaro

Na última terça-feira, o governo anunciou que houve 479 mortes no Brasil provocadas pelo coronavírus e perguntado sobre o assunto ele respondeu: “E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”. Muitos na imprensa brasileira entenderam que seria de pouca consideração pelos mortos e seus familiares. Como o assunto foi veiculado num dos programas da TV Globo, Bolsonaro considerou hoje que houve uma deturpação daquela televisão que ele chamou de “lixo”. Ele ameaçou não autorizar a renovação da concessão da emissora em 2022.

Algo parecido vem ocorrendo com outros órgãos da imprensa brasileira e os repórteres da Folha de S.Paulo, O Globo, o Estado de S.Paulo e do portal G1 não são atendidos nas suas questões. Fica somente com a Record, a SBT e a CNN Brasil que estavam presentes na ocasião. Independentemente da posição destes órgãos da imprensa, este tratamento desigual em nada ajuda a todos, nem ao governo ou a opinião pública nacional.

Há que se considerar que os anúncios de entidades do governo são tradicionalmente mal distribuídos, não correspondendo de forma necessária às audiências deles. A TV Globo que já foi beneficiada no passado conta hoje com menos do que algumas das suas concorrentes, quando medidos pelas suas audiências.

Até considerações de cunho religioso vêm influindo nestas dotações de verbas publicitárias. O presidente, depois de eleito, torna-se o mandatário de todos os brasileiros, independentemente de suas posições políticas ou religiosas.

É verdade que o presidente declarou hoje que, nos processos de renovação das concessões, todos os organismos serão igualmente considerados, mas lamentavelmente os chamados dízimos não são tributados, havendo suspeitas que elevados montantes de recursos estejam sendo transferidos para o exterior. Os analistas mais experientes sabem que nem sempre haverá completa justiça nestas distribuições de recursos de publicidade,

Também a ênfase que foi dada na qualificação do novo ministro da Justiça e da Segurança, como radical pastor evangélico, não parece ajudar a reduzir a inadequada polarização que vem ocorrendo no Brasil. No difícil momento de problemas de saúde e desequilíbrios econômicos profundos, há que se procurar um mínimo de unidade política, como vem ocorrendo em alguns países que não primam por estes princípios como Israel.

O aumento da radicalização não parece ajudar o Brasil.